O sonho é um grande paradigma para neurologia e psicanálise. Há cada noite de nossas vidas, somos acometidos por impulsos nervosos que trabalham em nosso cérebro, criando formas oníricas e refletindo nosso sentimento diário através de parábolas. Um território bastante explorado pela medicina, que todavia, não fora revelado por completo. Através desse mistério, o humano ainda tem o suporte de criar teorias, e brincar com esses espasmos criados pelo inconsciente. O tema já fora explorado em grandes obras, seja na literatura, na pintura ou na sétima arte.
Christophen Nolan, diretor e criador de "A Origem", abusou de seu repertório psicanalítico e filosófico para criar esse filme. Aliás, o cineasta sempre se aventurou no campo da psicologia em toda sua filmografia. Desde "Following" de 1998, primeiro filme do cineasta, que acompanha um homem em busca de seu lado obscuro e marginal. "Memento" de 2000, se auto-explica já em seu titulo, fazendo referência a uma expressão em latim, que designa a lembrança que o homem tem de sua eventual morte. Ou na plasticidade mística de "O Grande Truque", que Nolan brinca com o anseio do humano em se sobressair, mesmo que para isso ele tenha que iludir o próximo (e até o espectador). E por último, o grande blockbuster "O Cavaleiro das Trevas", que usa de personagens populares dos quadrinhos, para expor a famigerada bifurcação entre o bem e o mal, que os humanos tem em sua consciência durante toda existência.
Em "A Origem", o grande tema é o inconsciente humano, que através de uma tecnologia pouco conhecida, é explorado para fins ilícitos. Conhecido como um "ladrão de sonhos", Cobb (Leonardo DiCaprio) é um viúvo acusado de matar sua esposa Mal (Marion Cotillard). O homem coordena uma equipe, que junto com ele, cria sonhos afim de persuadir a vítima. No caso do empresário japonês Saito (Ken Watanabe), que através de uma má sucedida invasão em sua mente, descobre as artimanhas de Cobb e compania. Tendo como braço direito de seu trabalho Arthur (Joseph Gordon-Levitt), o viúvo recebe uma proposta irrecusável do poderoso Saito. O trabalho proposto pelo japonês não é meramente roubar algo do inconsciente da pessoa, e sim implantar uma idéia. Caso a proposta se concretize, Cobb poderá se livrar das acusações de homicídio que sua esposa implantou antes de se matar, e enfim reencontrar seus filhos.
A trama é amarrada por dezenas de explicações sobre o processo de incepção, podendo confundir o espectador mais distraído. Desde as camadas do sonho dentro de um sonho, até o artifício que a "quadrilha" usa para acordar simultaneamente. Tudo muito engenhoso e bem explicitado por Christopher Nolan. O elenco ajuda a transportar com êxito a magnificência do roteiro, contudo se tornam secundários dentre os efeitos especiais e a bela trilha sonora de Hans Zimmer, que certamente estará entre as indicadas ao Oscar 2011. Leonardo DiCaprio continua fazendo o mais do mesmo; Ellen Page ainda não saiu de sua Juno; e Michael Caine interpreta a si mesmo, mais uma vez. Cillian Murphy, talvez seja o melhor dentre os atores em cena, ao lado do eclético e talentoso Joseph Gordon-Levitt, que consegue sempre dar uma cara nova aos seus personagens. Tom Hardy, que interpreta o multi-facetas e manipulador de imagens oníricas Eames, também foi uma grata surpresa. E para finalizar, não posso deixar de registrar meu apreço pela exuberância francesa da talentosíssima Marion Cotillard, que tem um dos papéis mais importantes no enredo.
Além do embasamento filosófico, e da mão firme para levar um grande blockbuster, Nolan demonstrou coragem para assumir essa produção de risco. Afinal a Warner e a Legendary desembolsaram U$200 milhões para criar os devaneios oníricos dos protagonistas de "A Origem". Um investimento muito bem acolhido pelo público, que já o trata como um "cult", e como uma obra para ser admirada e apreciada mais de uma vez.
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