sexta-feira, 9 de julho de 2010

O DOCE AMANHÃ (1997)


Existem filmes melancólicos que foram feitos para ganhar Oscar. É o caso de "Preciosa", por exemplo, que exacerba todos os limites da melancolia em uma história pouco original e por vezes apelativas. Contudo existem películas magistrais que tratam o sofrimento humano, como um objeto de estudo e análise quase antropológica. Nesse âmbito, podemos encaixar o visceral "O Doce Amanha", do egípcio radicado no Canadá, Atom Egoyan.

Por ser ao lado de Denys Arcand, um dos queridinhos canadenses nos festivais ao redor do globo, Egoyan coleciona fãs de cinema de arte desde "Exotica" de 1994. Contudo sua obra suprema é esse drama de 1997, que "papou" nada mais que três prêmios no Festival de Cannes daquele ano.

Também pudera, o filme é um espetáculo. Desde sua fria fotografia, até a música incidental que remete ao grungie até o experimentalismo indígena. De fato são pontos relevantes, mas mesmo assim inferiores se comparado com o contexto e a estrutura do roteiro adaptado do cineasta Egoyan. Baseado em um romance de Russell Banks, "O Doce Amanhã" conta a história de Mitchell Stevens (excelente Ian Holm), um advogado que caça causas de acidentes, afim de conseguir indenizações. Deprimido, Stevens sofre a cada ligação que Zoe, sua filha drogada, lhe faz. Mesmo com o doloroso sentimento de tristeza pela filha, o advogado visita uma pequena cidade gelada do interior do país, para tentar descobrir e depois punir, um culpado pelo acidente de ônibus que resultou na morte de quase todas as crianças do local.

Através de sua lábia, Stevens seleciona pais que perderam recentemente seus filhos na tragédia. Como Sam Burnell (Tom McCamus), pai da adolescente Nicole (Sarah Polley), que apesar de ter sobrevivido ao trágico acidente, ficou paralítica. Em contrapartida, o durão Billy (ótimo Bruce Greenwood), que perdera seus dois filhos no fatídico acontecimento, vê em Stevens o oportunismo de um homem que ganha a vida à custa do sofrimento alheio.

Atom Egoyan foca no sofrimento retraído de um pequeno município, e o modo como o povo local trata o acidente, chocando-se com os príncipios de Stevens. Enquanto os habitantes da cidade fazem questão de evitar em tocar no melancólico passado, o advogado decide ir à fundo com a tristeza dos sofridos pais. Tal filosofia, o mesmo adota para sua vida pessoal, na qual procura respostas pelo caminho errado que sua filha tomara.

A melhor parte do filme talvez seja a história que Stevens conta referente à sua filha, quando a mesma tinha três anos de idade. É de uma sensibilidade que despensa retoques. Um pai desesperado, que na linha tênue da vida de sua pequena prole, entra em um dilema moral quando seu bebê é acometido por um choque anafilático e o mesmo deve perfurar sua garganta para que ela possa viver. A imagem da criança angelical, choca-se com a perfurante faca ao seu lado, pronta para traqueostomia.

Méritos de um cineasta talentoso e inteligente, que além de articular um bom roteiro, conseguiu registrar belíssimas performances de seu protagonista, e do elenco de apoio. "O Doce Amanhã" é uma obra-prima indigesta, mas que mantem uma mensagem otimista e revigorante ao término da película.

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